sexta-feira, 29 de abril de 2011
Gabinete de Rossoni tinha funcionária fantasma
Mãe de diretor da Assembleia, braço-direito do presidente da Casa, constava em lista de servidores sem nunca ter trabalhado no Legislativo
Publicado em 29/04/2011 | KARLOS KOHLBACH E HELIBERTON CESCA
Um documento obtido com exclusividade pela Gazeta do Povo revela que uma funcionária fantasma foi contratada por quase três anos, entre 2003 e 2005, no gabinete do deputado Valdir Rossoni (PSDB) – que hoje preside a Assembleia Legislativa do Paraná (Alep). O parlamentar nega a acusação. Nesse período, a Casa depositou R$ 331,5 mil como salário numa conta do banco Itaú, cujo titular ainda não foi identificado.
A funcionária fantasma é Hellena Luiza Valle Daru. Foi ela quem admitiu à Receita Federal que jamais esteve na Assembleia e que nunca recebeu “um centavo” da Casa. Hellena é mãe de Altair Carlos Daru, o homem de confiança de Rossoni. Daru é funcionário do deputado há cerca de dez anos e foi alçado a diretor administrativo da Assembleia quando Rossoni assumiu a presidência do Poder Legislativo, em fevereiro deste ano. Após a divulgação de mais um escândalo na Alep, Altair Daru foi demitido ontem por Rossoni.
Saiba mais
Confira trechos dos documentos sobre o vínculo de Hellena Daru com a Alep
Entrevista
Albari Rosa/ Gazeta do Povo
“Não tenho nada a ver com isso”
Hellena Luiza Valle Daru, mãe de diretor da Assembleia
Hellena Luiza Valle Daru – mãe do diretor administrativo da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) Altair Carlos Daru, demitido ontem – disse que nunca esteve no prédio da Assembleia, não trabalhou lá e nem recebeu “um centavo” da Casa. Apesar disso, a Receita Federal tem provas de que ela constou como funcionária da Assembleia entre janeiro de 2003 e junho de 2005. Neste período, ainda segundo documento da Receita, o Legislativo paranaense teria depositado R$ 331,5 mil em salários numa conta do banco Itaú.
À Gazeta do Povo, Hellena contou ontem que não conseguiu se aposentar até hoje e trabalha como costureira para ter um rendimento financeiro.
A senhora já trabalhou na Assembleia?
Esse assunto é com meu filho. Não trabalhei lá, não quero saber de nada.
Mas a senhora recebeu dinheiro de lá?
Não. Nem um centavo.
Mas a senhora sabe que foi incluída na lista de funcionários?
Não estou sabendo de nada.
A senhora chegou a ir na Assembleia alguma vez?
Não fui em parte nenhuma. Eu não tenho nada com isso, não recebi dinheiro, não trabalhei lá, não tenho parte com isso.
A senhora tem filhos que trabalham na Assembleia?
Eu tenho filho que trabalha lá, mas faz muitos anos que trabalha lá.
A senhora acredita que ele possa ter colocado a senhora como funcionária? Ele falou com a senhora sobre isso?
Não falou nada.
A senhora não teve problemas com o Imposto de Renda por causa dessa história?
Não. Meu Imposto de Renda é limpo. Nunca peguei um centavo de volta. Meu marido ficou doente cinco anos na cama e nunca levei uma receita para pegar dinheiro de volta.
Cartão, a senhora teve?
Não. Nas minhas mãos nunca veio nada. Eu até dei entrada várias vezes na aposentadoria, mas não deu certo por causa do meu Imposto de Renda. Meu marido era aposentado, o que ele ganhava era para os remédios dele. Então, tinha que trabalhar. Se não precisasse, você acha que eu estaria lá no meu cantinho trabalhando? Você acha que com setenta e poucos anos eu estaria trabalhando lá se tivesse recebido dinheiro?
O que a senhora faz?
Costuro. Faço e vendo moletom, camiseta, essas coisas... Então, se eu tivesse recebendo dinheiro por fora, não estava aqui...Eu não tenho nada com a Assembleia. Se meu filho lá, o que ele está fazendo junto com o presidente. Ele trabalha com o Valdir [Rossoni]. Eu fiquei até chocada, agora. Me deu até uma coisa ruim. Se eu tivesse dinheiro não estava aqui, estaria bem, estaria viajando, estaria bem tratada. Graças a Deus minha consciência está limpa, não tenho nada a ver com isso.
O caso de Hellena Daru começou a ser desvendado em fevereiro deste ano quando ela assinou um documento e encaminhou à Receita Federal dizendo que nunca trabalhou na Assembleia Legislativa. “Jamais mantive laços laborais com o dito órgão público” e “não percebi vencimentos oriundos da Assembleia”, escreveu Hellena no documento.
As declarações dela, no entanto, não batem com as informações da Receita Federal nem com os Diários Oficiais da Assembleia. Em agosto de 2005, a Assembleia divulgou um diário avulso que trazia o Ato da Comissão Executiva 365/05 exonerando Hellena de um cargo em comissão do gabinete de Rossoni.
De acordo com a Receita, ela teria sido admitida em janeiro de 2003 – foi nesta data que a Assembleia começou a reter o Imposto de Renda da funcionária Hellena Daru. Durante quase três anos, a Casa declarou ao Fisco o pagamento de salários para Hellena, mas ela nunca informou ter recebido dinheiro do Legislativo.
Os salários começaram polpudos. Ela entrou em janeiro de 2003 com um salário de R$ 10 mil. Já no mês seguinte pulou para R$ 25 mil mensais – valor mantido até abril. E de maio a dezembro houve redução para R$ 12,5 mil. “Não recebi dinheiro, não trabalhei lá, não tenho parte com isso”, reagiu Hellena, ontem, em entrevista à Gazeta do Povo (leia abaixo).
As declarações de Hellena Daru foram remetidas para o Ministério Público Federal (MPF), que investigava uma suposta organização criminosa que falsificaria declarações de Imposto de Renda para desviar a restituição do tributo de funcionários laranjas e fantasmas da Assembleia. Mas Hellena Daru não foi alvo da investigação porque os procuradores da República apuravam apenas casos em que as declarações ao Fisco eram falsificadas – o que não é o caso dela, que sequer apresentou os rendimentos oriundos da Assembleia.
Na terça-feira passada, a Receita, o MPF e a Polícia Federal deflagraram a Operação Tubarão, que resultou no cumprimento de mandados de busca e apreensão na Assembleia do Paraná e em quatro outros endereços em Curitiba. A suspeita é que cerca de 120 funcionários fantasmas e laranjas tenham sido usados no esquema.
Muitos dos investigados foram mostrados pela Gazeta do Povo na série Diários Secretos, que revelou desvio de dinheiro dos cofres da Assembleia e resultou na prisão de três ex-diretores da Casa. A operação da PF desta semana expôs mais um escândalo envolvendo o Legislativo do Paraná.
Presidente do Legislativo nega fraude e demite diretor
O presidente da Assembleia Legislativa, Valdir Rossoni, decidiu ontem demitir o diretor administrativo da Casa, Altair Carlos Daru, após ser informado sobre a denúncia de que manteve uma funcionária fantasma por quase três anos. A servidora era a mãe de Altair, Hellena Daru. Rossoni garantiu que nunca solicitou a contratação e a demissão dela e que Hellena não foi funcionária de seu gabinete.
Altair Daru foi o homem forte de Rossoni nos últimos dez anos. “É uma demonstração de lisura dessa administração. É uma precaução, não é um prejulgamento”, justificou o tucano, adiantando que, se nada for comprovado, Daru será readmitido para o cargo. O novo diretor administrativo da Casa deve ser anunciado na semana que vem.
Bagunça
Rossoni não soube explicar como a funcionária foi demitida do gabinete dele e responsabilizou a desorganização das gestões passadas. “A Casa contratava funcionários e colocava no gabinete dos deputados. As contratações e demissões aconteciam sem o conhecimento dos parlamentares porque não se exigia nenhum controle”, disse, afirmando que hoje a população sabe quem entra e sai na Assembleia.
Na terça-feira, dia da Operação Tubarão – que investigou o desvio de restituição de Imposto de Renda de funcionários fantasmas no Legislativo – Rossoni havia determinado ao procurador-geral da Assembleia, Luiz Caldas, que abrisse um procedimento para averiguar as denúncias.
Caldas explicou ontem que o protocolo citado no ato de exoneração de Hellena não existe. “O Protocolo 5.443, que está no Diário Oficial, não trata da demissão da Hellena Daru. Este protocolo é sobre o pagamento de uma passagem aérea ao [ex] deputado Pedro Ivo”, disse o procurador.
Ele afirmou ainda que consultou todos os protocolos do dia 20 de julho de 2005, data que consta no ato que exonerou Hellena Daru, mas nada teria sido encontrado, de acorodo com o procurador. “Os documentos mostram uma total desorganização da Casa, que cita um protocolo que não existe. O protocolo citado neste Diário Oficial não tem qualquer relação com a exoneração”, afirmou Caldas.
O diretor Altair Carlos Daru foi procurado ontem pela Gazeta do Povo, mas o seu telefone celular estava desligado.
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